SEGUINDO AS PISADAS NO COMPASSO DOS CACIQUES DO FUNDO DE QUINTAL

Munique Mattos

No fundo do quintal carioca, o samba sempre levantou poeira ritmadamente pelos pés calçados ou não de nobres partidos-altos, verdadeiros Caciques que, sapateando miudinho, meu bem, semearam chão imenso sob o testemunho e proteção da sublime Tamarineira. 

Fundo de Quintal, 1980. Da esquerda para a direita: Ubirany, Sombrinha, Sereno, Neocy, Jorge Aragão, Bira Presidente e Almir Guineto! Esses eram os primeiros anos do conjunto formado dentro das rodas do Cacique de Ramos.

Coleção Nelson Motta/Acervo MIS

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Uma sinfonia do samba fora elaborada ali – O repique de mão de Ubirany; o tantan desenvolvido pelo Sereno e o banjo com braço de cavaquinho, Almir Guineto. Enfim, a sinfonia constantemente viva  que até os dias de hoje e para a eternidade abrirá clarão para os riscados dos sapatos, ensinamento prático dos irmãos Bira e Ubirany! 

Bira e Ubirany

Sobre sapateado e dança do samba, Bira e Ubirany são muito importantes por um prisma de motivos:

  1. Pela vivência com os baluartes e patronos do samba carioca;
  2. Por trazerem essa experiência de memória como missão de seus projetos;
  3. Por conduzirem suas tradições de modo vivo e também singular, ofertando certo legado inovador ao meio;
  4. Mas principalmente para o legado da dança do samba, pela visão e cuidado de sempre em seus shows apresentarem a tradição do samba miudinho e com isso comunicando de modo prático essa tradição batucada dos pés dos sambistas, presença de suas experiências de fundo do quintal no Cacique de Ramos que é um reflexo de toda uma ancestralidade sambística e de expressão brasileira. São dos poucos que vêm comunicando o samba Sapateado nos seus shows.

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Homenagem do ano de 2020

A composição MIUDINHO, MEU BEM, MIUDINHO (Arlindo Cruz/Franco) além de ser icônica pela performance dos irmãos… não deixa de ser uma importante luz para conhecermos, reconhecermos e tornar perenes as matrizes não somente do sapateado do samba, mas as variadas expressões culturais brasileiras. Assim, contribui para nunca esquecermos e termos prazerosamente na ponta da língua! As matrizes do samba Carioca.

Abaixo a letra, em minha opinião, um “solfejo” da memória cultural brasileira:

“Pisa manso nessa dança pedaço de mal caminho
Faz passinho de criança e balança com carinho
Que vale um vintém
Miudinho, meu bem, miudinho
Balança com muita elegância
Na dissonância do meu cavaquinho
Meu bem, miudinho, meu bem
Sem tirar o pé do chão
Vem cantando o refrão, vem abrindo o caminho

Você é neta de Dora rainha do frevo e do Maracatu
Cai num fandango adora um fricote
Se rala num xote, baião e Lundu
Seu bisavô que era o rei da embolada
Quis armar uma cilada pro seu primo de Xerém
Maior calangueiro do rio de janeiro
Pintou no terreiro não deu pra ninguém então vem

Essa dança não é afoxé bate mão bate pé
Pra ficar bonitinho, meu bem
Miudinho, meu bem, miudinho

Bole bole que eu sei que não é mole
Afunfá um fole nesse miudinho meu bem
Miudinho meu bem.

A sua madrinha foi dançar bumba meu boi
Nunca mais quis voltar
Sua tia até hoje anda dançando ciranda
Nas bandas de lá

E no sufoco vi seu pai dançando côco lá na praça do barroco
Pra arrumar um pixolé
Se toda família já dançou quadrilha se liga na pilha
Vem dizer no pé vem na fé.

Se você já dançou um vasado, já dançou um reisado
Já leva um jeitinho
Miudinho meu bem miudinho.
Olha isso aqui não é jongo
Não faz passo longo faz bem miudinho, meu bem
Miudinho.”

Vejam!!! E ouçam a versão do programa ENSAIO com o fundo de Quintal 

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Os irmãos do Fundo de Quintal com maestria fizeram do mundo um solo único pelo soar mansinho e elegantemente imponente e contundente do batuque dos seus sapateados, brasileiros, cariocas, DO SAMBA! natureza do Mundo que também vem da gente!

Sapateado do samba: ancestralidade presente

Bira e Ubirany são herdeiros diretos da convivência com aqueles considerados os formuladores de nossa genuína música nacional. Oh abram alas para a santíssima trindade dos primeiros quintais do samba: Donga, Pixinguinha e João da Baiana: Dizendo no pé!

Madureira: Ontem e Hoje https://www.facebook.com/madureiraontemehoje/photos/a.2520454198068554/3091624660951502/?type=3

 

Pixinguinha

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Donga

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João da Baiana

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Mú! DANÇAs!

Poema extraído do Dossiê das Matrizes do samba

Um dia, numa data do final do século passado, assisti a recorrente performance dos irmãos Bira e Ubirany do grupo Fundo de Quintal sambando o miudinho ou “dizendo no pé” numa das mídias mais populares de nosso país. O que me chamou atenção à época foi o apresentador do programa e os componentes desse notório grupo de samba chamarem atenção para suas missões como músicos sambistas: a de serem guardiões das matrizes do samba carioca sem deixar de dialogar com seu próprio tempo e identidades.

Alguns anos mais tarde, porém, em outro século já (XXI), o ano era 2006, adquiri o famoso DVD FUNDO DE QUINTAL CONVIDA, no estande de CDs e DVDs de uma loja multinacional de variedades, também famosa e atualmente, aparentemente, decadente na cidade do Rio de Janeiro. Assistir novamente a performance dos irmãos do Fundo de Quintal em sua dança miudinha, dessa vez, me chamou atenção novo detalhe: Reparei principalmente que na dança miudinha, muito destra e elegante havia um ingrediente percussivo dos gestos dançados que não se limitavam ao acompanhamento musical dos instrumentos tradicionais do grupo: havia ali, segundo minha intuição, UM SAPATEADO, ou seja, um batuque realizado com os pés.

Os irmãos Bira e Ubirany dançam Miudinho, meu Bem Miudinho em FUNDO DE QUINTAL CONVIDA

Essa reflexão e/ou insight passou a ser uma interessante maneira de vivenciar, reconhecer e enaltecer a cultura nacional, em especial a sambística, além de possibilitar reflexões e atitudes mais críticas sobre nossa comunidade mundial.

Legado também em mim: algumas reflexões / performances 

A NATUREZA DO SAMBA 

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JONGO SAPATEADO

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SAMBA AFEMINADO 

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BATUCA NO CHÃO

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Portfólio vídeo

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Pelos sapateados do mundo e os do Brasil e do samba podemos chamar atenção para pautas de evolução de nosso sistema, chamamos atenção para a diversidade, e a cada novo passo podemos buscar o compasso e resolver nosso maior desafio, a própria diversidade e o tão sonhado encontro com a paz. 

Beleza do sapateado

Este presente texto deseja lembrar-nos que o Brasil tem uma singular e diversa tradição de sapateados Brasileiros, em especial, sensibilizar sobre o SAPATEADO DO SAMBA. Este dado pode soar estranho para boa parte do MUNDO! Afinal, sobre Sapateados nossas memórias nos levam direto para determinados estilos estrangeiros, pois, parece que até muito pouco tempo em nossa memória local, sapateado não era sinônimo de Brasil e, até parece que parece que, ainda não é. Mas É! 

Mas o que é que o samba não tem? “Disse a mim certa vez Tantinho da Mangueira quando lhe indaguei sobre o Sapateado Brasileiro do samba, durante um evento que participamos e cuja memória e quintal também se faz presente. No caso deste, o da Praça Onze do Calouste Gulbenkian.

A sambista Márcia Lopes, Tantinho da Mangueira ao centro e eu, Munique Mattos. Imagem de arquivo pessoal de evento sambístico no Calouste Gulbenkian na Praça Onze. Acervo pessoal da autora

O samba , então, é esse lindo exemplo de Sapateado Brasileiro, síntese da presença dessa linguagem tão diversa nas manifestações corporais de nosso país (catira, jongo, coco, samba de roda, samba de Pareia, cavalo marinho), assim pensava Elton Medeiros. E eu além de concordar, me inspiro e completo: o sapateado do samba é síntese de todo universo de sapateados desse planeta, nele pode e já vemos cantar os saberes de nossa espécie em pisadas de trânsito. E, por ser diverso, é também singular ( existe o americano, o do samba, indiano, o irlandês, etc) No mundo, então, existe uma DIVERSIDADE de formas singulares pessoais e coletivas de se sapatear. Mas acho importante especialmente entoar que sapateado é linguagem humana, e que nos une como seres da mesma espécie, ligados por uma raiz de ancestralidade profunda e misteriosa geradora desse ritmo que nos move a todos! 

Devidas homenagens

vide melhor essa imagem e mais no portfólio
https://drive.google.com/file/d/1WcPGtIYM4jL6XbUMoDAo6MNj9cvb6NFk/view?usp=drivesdk

Este texto dedico à muitas pessoas… muitos que torcem e acompanham o empenho e a devoção necessárias para conhecer a história que a história não conta… Deus e seu arranjo sublime de interlocutores me dão o privilégio de agradecer o Convite feito pelo CAFÉ CACIQUE , na pessoa de Walter Pereira, de modo auxiliar difundir essa informação tão preciosa para a cultura e as artes e o pensamento do humano!!!

Muito obrigada meus pais! Pela paciência… e por possibilitarem viver e conhecer verdadeiros guardiões que me abriram portas para chegar à convivência com alguns desses grandes mestres.

E dessa Salvaguarda, muitos nomes poderia mencionar… mas hoje represento toda uma nação que celebra e torce pelo sucesso do Sapateado do Samba, através de homenagem in memória para minha amiga e grandiosa colaboradora, Márcia Lopes. Pessoa que conviveu e compartilhou dessas convivências tão raras de nossa cultura do samba comigo. Foi ela quem me apresentou à  família Fundo de Quintal e dessa maneira pude colher toda uma boniteza de trato e gentileza da família Cacique/Fundo de Quintal!

Concluo então esse primeiro texto com o registro e a letra da canção que magistralmente Márcia compôs para o sapateado do samba, tendo como destaque a família de Sr Domingos, pai de Bira e Ubirany, além.

Beleza do Sapateado. Composição de Márcia Lopes 

https://www.instagram.com/reel/Csqp_chg3B1/?igshid=MzRlODBiNWFlZA==

ANEXOS:

E muitos outros materiais gritam! Alguns destaques de outros importantes parceiros do Fundo de Quintal:

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SAMBA DE PARTIDO ALTO de Aniceto do Império 

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O doc SAMBA NO PÉ de Elton Medeiros

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Paulinho da Viola e a velha Guarda da Portela 

Os Caciques e eu

Munique e Bira Presidente no Cacique de Ramos

https://www.instagram.com/p/CSR99Wbg1wK/?igshid=MzRlODBiNWFlZA==

Munique e Ubirany no evento MEMÓRIAS DO SAPATEADO DO SAMBA 

https://www.instagram.com/reel/CupzyK3pprz/?igshid=MzRlODBiNWFlZA==

Bora Caciquear… sambatear, gente!!!!!

Sobre a autora:

Compositora e cantora, Bacharel em Dança pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Atriz, formada pela Escola Técnica de Teatro Martins Penna. É bailarina-pesquisadora, sapateadora, compositora, percussionista corporal e professora. Atuou em diversas companhias e espetáculos artísticos. Como compositora, sagrou-se campeã no Bloco “Engata no Centro” 2018 e “Bloco Tá Pirando pirado Pirou” 2020. Desenvolve pesquisa sobre Sapateado do Samba, desde 2006. Integra, desde 2017, o projeto de inclusão social pela cultura do Samba do Coletivo Carnavalesco Tá Pirando, Pirado, Pirou! É também membro do Movimento de Compositores Samba na Fonte desde 2012. E mais recentemente do projeto SAMBAÚ. Mas em síntese, a salvaguarda de um sapateado próprio do samba carioca é destaque nessa trajetória desde 2006 até os dias atuais.